Colonos  Holandeses ( Beaucourt ) no vale do Mucuri.

Na Europa era comum dizer: “Cuidado, senão eu te mando para o Mucuri!”, avisavam os pais quando os filhos eram desobedientes, pois ser mandado para o Mucuri era a pior coisa que poderia acontecer a alguém. Foi o que aconteceu ao grupo de 162 holandeses e belgas. Eles chegaram no mês de julho de 1858 a São José do Porto Alegre, ao norte do Espírito Santo na divisa com o estado da Bahia.
Assinaram um contrato com a Associação Central de Colonização em Zeeland, Antuérpia ou no Rio de Janeiro. Porque e por quais motivos essas famílias foram para o Mucuri e as outras para Rio Novo não está claro.
Uma lista foi trazida pelo frei franciscano Olavo Timmers (1901-1990) que trabalhou como missionário naquela região e que em 1966 estava de licença na Holanda. Ele foi o primeiro a divulgar a presença desses holandeses no vale do Mucuri. Os nomes ele tinha copiado de um relatório da Companhia do Mucuri feito quatro anos depois da chegada em 1862. O relatório incluía 12 casais e 51 crianças, todos da província de Zeeland vindos de Schouwen Duiveland e Zuid Beveland.
A intenção era a de que os ‘Colonos Beaucourt’ reforçassem a população da Colônia Militar do Urucu. Essa colônia militar fica no caminho de Santa Clara a Filadélfia, atualmente Nanuque e
Teófilo Otoni.
O que estas famílias tiveram de enfrentar é difícil até de imaginar. A Companhia do Mucuri é responsável pelo transporte a partir do Rio de Janeiro. Com uma pequena embarcação e alguns barcos rebocados para a bagagem eles navegam pelo rio Mucuri em direção ao interior até chegarem a primeira grande cachoeira, no assentamento Santa Clara. Lá eles são acomodados
em um galpão.
A última etapa da viagem deve ser feita a pé. A bagagem vai em carros de boi. Esse primeiro contato com a mata atlântica é cruel para as famílias de Zeeland. Os seus corpos, pele, olhos e ouvidos não estão preparados para isso. Árvores imponentes, um emaranhado de folhas
ligadas por cipós não deixam os raios do sol passarem, arbustos e todo tipo de obstáculos impedem a passagem. Mosquitos e estranhos insetos os rodeiam e formam verdadeiras nuvens que tentam penetrar via boca e nariz. As roupas compridas e quentes de Zeeland os protegem um pouco. Por causa do calor e do perigo de serem de repente atacados por índios que se escondem na mata, eles caminham à noite por trilhas recém desmatadas.
Depois de terem se arrastado dessa forma por noites a frio, os imigrantes finalmente chegam à Colônia Militar do Urucu. A viagem durou seis dias desde a partida do porto.
Colônia Militar Urucu
O diretor da Colônia Militar, capitão Manoel Joaquim de Barros, se encontra acamado, seriamente doente, e sem condições de organizar o alojamento dos holandeses. Eles dependem então dos
escrúpulos de militares de baixo escalão. Os imigrantes dormem como soldados em casernas em camas de madeira, mulheres e crianças separadas dos homens. Comida é racionada devido à seca predominante. Alguns homens são levados ainda mais adiante na mata praticamente impenetrável, com todo tipo de insetos rastejantes, puladores e voadores. Eles realmente estão no inferno verde. Os soldados indicam: desta árvore até aquela é sua propriedade e daquela até a outra é a do seu vizinho. Machados e enxadas são distribuídos. Famintos, os imigrantes têm que limpar uma parte da mata sem nenhum outro recurso, sem a força dos cavalos ou bois.
Nunca antes eles viram árvores tão grandes e tão perto uma das outras. Um gigante desses, mesmo depois de ter sido cortado dos dois lados, ainda fica de pé, pois a copa está ligada a outras árvores através de cipós. Para conseguirem abrir uma clareira na mata às vezes é preciso cortar de seis a 12 árvores. Uma rajada de vento ou oscilação de uma das árvores pode fazer com que todas venham abaixo ao mesmo tempo com um estrondo que pode ser escutado há quilômetros do local. Estalidos de galhos que caem, um redemoinho de folhas e poeira. Uma revoada de pássaros. Situação assustadora.
Sem recursos os Zeeuwen simplesmente não conseguem fazer o serviço. Do quartel não vem nenhum tipo de ajuda. Até que finalmente Teófilo Otoni, o diretor da Companhia do Mucuri, coloca alguns escravos e bois à disposição. Esses escravos são experientes. O que não pode ser usado da madeira derrubada é queimado. Depois disso, as raízes desses gigantes da mata, que muitas vezes têm centenas de anos, precisam ser retiradas e o solo preparado para o plantio. Somente depois de tudo isso é que se pode começar a semear, plantar e esperar pela chuva.
Enquanto isso, eles constroem casinhas com troncos e argila e, se tudo correr bem, alguns meses depois já será possível colher feijão e milho. Até esse dia, comida seria distribuída. Apesar de suas preces e súplicas, a chuva não chega. A conseqüência disso é a falta de alimentos e também de leite para as crianças.
As pessoas são atormentadas pela malária, febre amarela e tifo, sofrem com feridas provocadas por bichos de pé, carrapatos e outros insetos desconhecidos. Na Colônia Militar, além de soldados brasileiros, eles encontram alguns índios, trabalhadores chineses contratados
e imigrantes de Madeira. Imigrantes chegam a todo o momento sem controle algum, todos com o mesmo sonho de uma vida próspera num paraíso tropical. O sonho se transforma em um pesadelo com doenças, mortalidade infantil, desilusão, alcoolismo, fome e morte. Suas forças, energia e coragem desaparecem como que engolidos pela terra.

One Response so far.

  1. Alguna noticia da familia do JACOB HAGESTEYN??

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