Meu primo, Júlio Carlos Sommerlatt, conhecido como Julinho, nasceu órfão de pai e recebeu o carinho de toda a família e atenção especial do tio solteiro Raynold sommerlatt, conhecido como Renol, que  lhe devotou a atenção de um pai, proporcionando-lhe várias chances para estudar tanto em Teófilo Otoni como em Belo Horizonte.

Júlio, boêmio juramentado, preferiu viver sua adolescência, aproveitando os prazeres em roda de bares e entre as mulheres. Ele contou-me, como uma confissão de arrependimento, que em Belo Horizonte , freqüentava os bares do edifício Maleta, junto com a turma do seu primo, Nuno Sommerlatt Barbosa, conhecido como “Chefe Nuno”,  a quem , acompanhava nas farras mas não o imitava nos estudos, gastando suas mesadas sem nenhum rendimento na escola, tendo que voltar para  Epaminondas Otoni, (Colônia Militar do Urucu ) onde nascera.

Tentou trabalhar no Projeto JARI do milionário Daniel Ludwig, na Amazônia, onde seu primo Wilberto Sommerlatt Barbosa “Diba”, tinha um cargo de chefia,  mas não obteve sucesso.

Eu, que o chamava de Júlio Barrabás, convidei-o para trabalhar conosco no projeto de cacauecultura em alta Floresta no Mato Grosso a 870 km ao norte de Cuiabá-MT.  Foi meu grande companheiro, responsável pela  contabilidade, percorríamos diariamente, desde a madrugada até noite fechada, as áreas de implantação da lavoura que ficavam em três locais diferentes.

Eu, menino de 25 anos, destemido, saudável e muito agitado, levantava-me de madrugada, tomava um cafezinho magro, às vezes só com língua e adentrava na mata densa sem me preocupar com o que ia comer durante o dia. Visitava uma  das fazendas na parte da manhã  e na maioria das vezes, quando os homens paravam para almoçar, eu seguia viagem para outra área, aproveitando o horário de almoço para o deslocamento, aproveitando a tarde para fiscalizar o trabalho, com os trabalhadores  em pleno exercício das suas tarefas. E quando eles paravam para jantar, eu tinha que pegar a estrada, retornando  a cidade para providenciar os materiais necessários para os dias seguintes. A logística não podia falhar, pois se faltasse algum material, vários homens paravam e  o cronograma ia para o brejo.

Barrabás, acompanhou-me no seu primeiro dia de trabalho, não queixou-se, mas no dia seguinte ele me fez um grande favor, que com certeza reflete na minha boa saúde para sempre, passou a preparar a nossa matula com lanches fartos com uma boa garrafa de café e cantil com água fresca. Contou-me então que tinha uma úlcera e que não podia ficar com o estomago vazio por longos períodos.

Estávamos em uma área rica em ouro, e portanto, vivíamos em constante conflito com os garimpeiros e compradores de ouro com um alto índice de assassinato. Barrabás, que durante nossas viagens diárias, ouvia o Programa do garimpeiro, da Rádio Nacional, onde as famílias pediam notícias dos parentes que estavam nos garimpos, passou a pegar os documentos nos bolsos das roupas de todos os mortos que eram encontrados na mata ou nas estradas que davam acesso aos garimpos, e postava-os nos correios, endereçados à Rádio Nacional, com um bilhete descrevendo o local exato  em que o corpo fora encontrado. Segundo ele, era um serviço de utilidade pública.

Num domingo, Barrabás descascava, sentado na cabeceira da sua cama  enquanto eu limpava uma carabina  Magnum 357, descontraidamente o cano da arma apontou pra seu rosto e ele, empurrou o cano da mesma, com as costas da mão, exatamente no momento em que a arma disparou. Eu fiquei paralisado, sem graça , ele que era muito vermelho, ficou branco feito uma cera, Sostênio Tomich que morava conosco, pediu calma, chamou minha atenção para o perigo de manusear arma perto de pessoas e fomos ver a trajetória da bala; Pegou na parede de táboas a 3 dedos da cabeça de Júlio Barrabás, atravessou 3 cms de angelin pedra, atravessou um pilar de madeira dura de 12 cms, pegou na dobradiça de latão do portão que se enrolou como se fosse um papel amassado na mão e subiu num anglo de mais de 45º o que evitou que atingisse uma casa que ficava em frete.

Toda as suas economias, eram guardadas em jóias, fabricadas por Tetéu, um ourives nosso amigo. E sempre que ele ia a Cuiabá, parte das sua jóias ficavam com as mulheres na zona boêmia mais cara do Brasil.

Logo que terminamos de implantar o projeto, me dediquei ao garimpo, fui morar em Serra Pelada e ele voltou para Teófilo Otoni, onde passou a trabalhar com um amigo nosso, Sr. Abdala, na Revena, uma concessionária da Volkswagen, até o dia do seu falecimento.

Que DEUS o tenha Julinho.

Jorge Nei Jamel Edim

Leave a Reply

    Seguidores